sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Tira o rosário do meu ovário

Há um ano atrás, depois de ter ido assistir às comemorações oficiais do Cinco de Outubro no Largo do Município onde o o hino nacional e o hastear da bandeira foram submergidos pelos gritos DEMISSÃO DEMISSÃO DeMISSÃO dos que se tinham ali juntado, cruzei-me na avenida da liberdade com um grupo estranho. Pessoas vestidas de branco, algumas com balões, cantavam o Alecrim Alecrim Dourado que nasce no Monte sem Semeado. Algumas vinham com bebés ao colo e crianças pela mão. Que seria aquilo? Tentei perceber melhor mas o tom esganiçado de alguém ao megafone não deixava descortinar o teor do encontro. Eram muitas e muitos, e lá fomos entendendo porque vinham com rosários e alguns de bíblia na mão e empunhavam cartazes com fotografias de crianças. Esta gente não tinha vindo celebrar a república nem passear pela avenida num dia de sol. Vinha em família reinvicar os direitos daqueles que não nasceram a poderem fazê-lo. Portanto uma amálgama de gente inexistente que de repente se encontraria representada, à força, por este discurso. Representar os fantasmas é de génio, porque é um manancial muito dado à vastidão e ao silêncio. Estes amigos do incomensurável vão voltar a passear pelas ruas de Lisboa amanhã, eu gostava de ter tempo para os ir entrevistar e saber das suas propostas no que diz respeito ao muito comensurável problema das crianças institucionalizadas que não encontram famílias que os adoptem, ou que os consigam adoptar. Ao muito palpável problema do aumento da pobreza no país que tem levado ao aumento da entrega de crianças a instituições. Esta gente não diz que é contra a despenalização da IVG mas é a isso que vêm, tentar pôr os rosários nos nossos ovários. Rosários de hipocrisia à Jonet - alguém que não exerce uma profissão há duas décadas sem ser ocupar-se do banco alimentar vem dizer que há um negócio da pobreza em Portugal e que os pobres não querem trabalhar.

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